quarta-feira, 27 de fevereiro de 2013

EPIDEMIOLOGIA APLICADA ÀS ZOONOSES - PARTE II - FEBRE AMARELA


Descrição: Doença febril aguda, de curta duração (no máximo 12 dias) e gravidade variável. Apresenta-se como infecções subclínicas e/ou leves até formas graves, fatais.

 
                                                                                                                             Rev. Soc. Bras. Med. Trop. vol.36 no.2 Uberaba Mar./Apr. 2003
 
O quadro típico tem evolução bifásica (período de infecção e de intoxicação), com início abrupto, febre alta e pulso lento em relação à temperatura (sinal de Faget), calafrios, intensa dor de cabeça, dores musculares, prostração, náuseas e vômitos, durando cerca de 3 dias, após os quais se observa remissão da febre e melhora dos sintomas, o que pode durar algumas horas ou, no máximo, dois dias.

O caso pode evoluir para cura ou para a forma grave (período de intoxicação), caracterizada pelo aumento da febre, diarréia e reaparecimento de vômitos com aspecto de borra de café, instalação de insuficiência hepática e renal.

Surgem também icterícia, manifestações hemorrágicas (vômito com sangue, sangue nas fezes – fezes negras, sangramento nasal, urina com sangue, sangramento vestibular e da cavidade oral, entre outras), petéquias (pontos vermelhos) e equimoses (manchas roxas) em várias partes do corpo, diminuição do volume urinário, albuminúria e prostração intensa, desidratação, agitação, delírio, parada renal, torpor, coma e morte.
                                                                                                                      Rev. Soc. Bras. Med. Trop. vol.36 no.2 Uberaba Mar./Apr. 2003
 
Agente: O vírus da febre amarela é um Flavivirus. Por ser transmitido por um artrópode (inseto) é chamada de arbovirose.

1.     Reservatório: Na forma silvestre principalmente os primatas pertencentes ao gênero Alouatta (guariba), Ateles (macaco aranha) e Callithrix (sagui) são muito sensíveis ao vírus e apresentam alta taxa de letalidade enquanto o Cebus (o termo macaco-prego é, atualmente, a designação genérica das espécies do gênero Cebus)  é facilmente infectado e tem baixa taxa de letalidade e desenvolvem imunidade. Ainda são reservatórios o Homem, mosquitos, marsupiais e ratos.

 

Vetor: O Aedes albopictus se introduziu no Brasil, em 1986, através do estado do Rio de Janeiro, provavelmente importado dos Estados Unidos, tendo rapidamente se expandido para os estados do Espírito Santo, Bahia, Minas Gerais, São Paulo e Paraná.

Possui este mosquito a capacidade de combinar os ciclos silvestre e urbano da FA, no continente americano. Sem dúvida, ainda não se comprovou qualquer participação desta espécie na transmissão da doença.

                                                                         
O mosquito da espécie Aedes aegypti é o principal transmissor da Febre Amarela Urbana. Na Febre Amarela Silvestre, os transmissores são mosquitos com hábitos eminentemente silvestres, sendo que os dos gêneros Haemagogus e Sabethes são os mais importantes na América Latina.

 No Brasil, a espécie Haemagogus janthinomys é a que mais se destaca na perpetuação do vírus.


                                                                                                                  Haemagogus janthinomys
                                                                                                                        Rev. Soc. Bras. Med. Trop. vol.36 no.2 Uberaba Mar./Apr. 2003

Período de incubação: 3 a 6 dias

Período patogênico: 12 dias

Período pré-patente: 5 dias

Período de transmissibilidade: O período de transmissibilidade da doença compreende dois ciclos: um intrínseco, que ocorre no ser humano, e outro extrínseco, que ocorre no vetor.

A viremia humana dura, no máximo, 7 dias, e vai desde 24 a 48 horas, antes do aparecimento dos sintomas, a 3 a 5 dias, após o início da doença, período em que o homem pode infectar os mosquitos transmissores.

No mosquito, após um repasto de sangue infectado, o vírus vai se localizar nas glândulas salivares da fêmea do mosquito, onde se multiplica depois de 8 a 12 dias de incubação. A partir desse momento, é capaz de transmitir o vírus amarílico até o final de sua vida (de 6 a 8 semanas) e ainda há transmissão transovariana.

 Transmissão: picada do vetor

Letalidade: Nas formas graves chega a 50%, quando se considera todos os quadros clínicos fica entre 5 e 10%.

Ecologia: A febre amarela é uma doença silvestre que circula entre os primatas e mosquitos. O homem acidentalmente se infecta e podendo vir ao meio urbano encontra o Aedes spp podendo reiniciar um ciclo urbano. O Aedes precisa de coleções de água que não precisam ser permanentes pois os ovos podem ficar meses fora da água. Com isto facilita a dispersão do vetor.

 Epidemiologia: Epidemiologicamente, a doença pode se apresentar sob duas formas distintas: febre amarela urbana (FAU) e febre amarela silvestre (FAS), diferenciando-se uma da outra apenas pela localização geográfica, espécie vetorial e tipo de hospedeiro.


                                                               Manual de Zoonoses Vol. 1 – CRMV-RS
    

Em geral, apresenta-se sob a forma de surtos com intervalos de 5 a 7 anos, alternados por períodos com menor número de registros.

Na população humana, geralmente o aparecimento de casos é precedido de epizootias em primatas não humanos. No Brasil, a partir da redução populacional do vetor urbano em 1942, só há ocorrência de casos de FAS e os focos endêmicos até 1999 estavam situados nos estados das regiões Norte, Centro-oeste e área pré-amazônica do Maranhão, além de registros esporádicos na parte oeste de Minas Gerais.


                                                                                                                            Guia de Vigilância Epidemiológica – Ministérioo da Saúde 2010
 

Nos surtos ocorridos no período de 2000 a 2009, observou-se uma expansão da

circulação viral no sentido leste e sul do país, detectando-se sua presença em áreas silenciosas há várias décadas.

Foram redefinidas, então, duas áreas no País:

a) área com  recomendação de vacina (ACRV), correspondendo àquelas anteriormente denominadas endêmica e de transição, com a inclusão do sul de Minas Gerais, até então considerado “área indene de risco potencial”;

 b) área sem recomendação de vacina (ASRV), correspondendo, basicamente, às “áreas indenes”, incluindo também o sul da Bahia e norte do Espírito Santo, que antes eram consideradas “áreas indenes de risco potencial”.

No período de 1980 a 2009, foram confirmados 772 casos, dos quais 399 evoluíram para óbito, letalidade média de 51,7% com variação de 24 a 100%. Todas as unidades federadas da região Norte registraram casos no período, ainda que esporádicos, sendo responsáveis por 33,7% das notificações do país, nas três últimas décadas. A região Centro-oeste notificou 28,6% dos casos do período e a região Sudeste 20,7%. O Nordeste (Maranhão e Bahia) foi responsável por 14,2% dos casos e a região Sul (Paraná e Rio Grande do Sul) por 2,8%.

 
Esta doença acomete com maior frequência o sexo masculino e a faixa etária mais atingida situa-se acima dos 15 anos, em função da maior exposição profissional, relacionada à penetração em zonas silvestres da área endêmica de FAS.

Outro grupo de risco são pessoas não vacinadas que residem próximas aos ambientes silvestres, onde circula o vírus, além de turistas e migrantes que entram nestes ambientes.

A maior frequência da doença ocorre nos meses de janeiro a abril, período com maior índice pluviométrico, quando a densidade vetorial é elevada, coincidindo com a época de maior atividade agrícola.

A febre amarela urbana não ocorre no país desde 1942. Enquanto não havia registro do vetor urbano o Ae. aegypti  havia uma relativa segurança quanto a não possibilidade de reurbanização do vírus amarílico. Entretanto, a reinfestação de extensas áreas do território brasileiro por esse vetor, inclusive já presente em muitos dos centros urbanos das áreas de risco, traz a possibilidade de reestabelecimento do ciclo do vírus.

Consideram-se como potenciais fatores de risco para reurbanização da febre amarela no Brasil:

• expansão territorial da infestação do Ae. aegypti, já detectada em 4.007 municípios, distribuídos por todas as unidades federadas;

• áreas com Ae. aegypti superpostas a áreas de circulação do vírus amarílico;

• presença do Ae. albopictus em estados das regiões endêmicas e de transição;

• áreas urbanas infestadas por Ae. aegypti próximas de áreas de risco para febre amarela silvestre;

• intenso processo migratório rural-urbano (caminhadas ecológicas, cafés e restaurantes coloniais, pousadas rurais, etc.) levando à possibilidade de importação do vírus amarílico dos ambientes silvestres para os urbanos.

 

Controle: Vacinação, onde os anticorpos aparecem de 7 a 10 dias depois da vacinação e persistem pelo menos por 17 anos ou mais. Controle do vetor, controle de focos, educação para a saúde, cuidados em áreas florestais. Não há necessidade de isolamento e nem de quarentena.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Não existe tratamento específico. É apenas sintomático, com cuidadosa assistência ao paciente que, sob hospitalização, deve permanecer em repouso, com reposição de líquidos e das perdas sanguíneas, quando indicado. Nas formas graves, o paciente deve ser atendido em uma unidade de terapia intensiva, o que reduz as complicações e a letalidade.